Sob discussão polêmica, a Proposta de Emenda Conscitucional (PEC) que possibilita a mudança na jornada de trabalho semanal e fim da escala de trabalho 6×1 vem dividindo opiniões entre os setores: empregadores e empresários são contra a mudança, que é defendida com afinco pelos trabalhadores. Para a advogada especializada em direito trabalhista Giselle Saggin, a mudança na jornada pode encontrar resistência, mas é benéfica para a qualidade de vida do empregado e para a própria produtividade no serviço.
Reprodução
“Mudando essa escala, o trabalhador teria mais tempo de qualidade com a família, para descansar, para resolver coisas pessoais. Porque, da forma que é imposta hoje, geralmente a pessoa trabalha seis dias e folga um, tendo um dia apenas para estar com a família, cuidar das suas coisas, resolver problemas que dependem de serviços, cartório, banco, além de descansar. Com a mudança de escala, a maior vantagem é o trabalhador ter mais tempo para descansar, um descanso físico e mental”, afirma.
Conforme explica a advogada, há outros países em que testes foram feitos com redução da jornada e restou evidenciado nessas experiências uma maior produtividade, menos faltas do empregado e menos doenças ocupacionais. “O resultado é um empregado menos estressado, com melhor convivência com os outros colegas, com menos doenças ocupacionais, transtornos e ansiedade causados pelo estresse”, pontua.
Nas últimas semanas, com o debate à tona, empresários, entidades e políticos se pronunciaram contra a PEC. Uma das justificativas é a preocupação com o alto custo e uma menor produtividade do empregado. Além disso, o setor produtivo alega a possibilidade de uma redução de salários ou demissões em massas.
“O resultado é um empregado menos estressado, com melhor convivência com os outros colegas, com menos doenças ocupacionais, transtornos e ansiedade causados pelo estresse”
“Vai-se criando esse burburinho na economia, porque a ideia da PEC é justamente diminuir o tempo de trabalho do empregado mantendo o mesmo salário. Ao meu ver, não traria esse impacto negativo se partirmos do pressuposto que o empregado vai produzir mais, mesmo trabalhando menos tempo. Porque não é apenas relativo ao tempo que o colaborador está na empresa, mas o que ele produz naquela empresa”, defende a advogada.
Segundo Giselle, o período inicial de transição trará impactos, como sempre acontece com outras alterações na legislação, mas o resultado final será positivo. “A própria reforma trabalhista que nós tivemos em 2017, houve um período nebuloso. Toda mudança traz esse período de caos. Mas acredito que, a médio prazo, vai impactar de forma positiva na economia e na relação entre empregados e empregadores. O que a gente pode perceber nos países que já usam essa escala menor é que as empresas tiveram aumento de produtividade, de ganhos, e não diminuição, como estão temendo”, analisa.
A discussão ainda está no começo. A PEC que reduz a jornada máxima de trabalho de 44 para 36 horas semanais recebeu, nesta quarta-feira (13), o número necessário de assinaturas para ser protocolada na Câmara dos Deputados. Para se tornar uma matéria em tramitação na Câmara, a proposta precisava de, no mínimo, 171 assinaturas de apoio, parcela do total de 513 deputados. Como ainda está no início, a proposta ainda deve passar por longos debates e alterações, correndo o risco de ser engavetada, como aconteceu com outras proposituras parecidas desde 2001.
“Estamos em um momento diferente do nosso país, da nossa economia, até de conscientização da população. Pode ser que essa agora a gente consiga um resultado. Talvez não de uma escala 4×3, mas um meio termo, que seria o 5×2”, pondera.
Acordos coletivos
No caso das categorias que são regidas por acordos coletivos, com funcionamento de escalas especiais, os acordos terão que ser revisados de acordo com a nova lei, caso a PEC seja aprovada. “Se existe uma lei, esses acordos terão que ser redigidos novamente e enquadrados dentro da lei, pois os acordos coletivos só podem o que estiver dentro da lei. Mas claro que tudo tem um período de vacância determinado”, explica.
Resistência
A advogada, que atua diariamente com causas trabalhistas, afirma que ainda há muita resistência dos empregadores sempre que há discussões sobre mudanças – pautada principalmente pela história do país -, mas que aclasse não tem o que temer.
“Ainda temos aquela ideia de que para o empregado valer, precisa trabalhar sempre mais e produzir sempre mais”
“Principalmente porque no Brasil nós viemos de uma cultura de escravidão, que está enraigada em nós. Ainda temos aquela ideia de que para o empregado valer, precisa trabalhar sempre mais e produzir sempre mais. Além disso, as empresas querem ganhar mais com menos gastos, e com as mudanças terá o impacto fiscal. Entendo que algumas empresas são bem judiadas em relação a impostos, mas o caso que estamos tratando nessa PEC não é esse. Estamos falando da dignidade do trabalhador”, defende.
A PEC
A alteração da jornada de trabalho foi proposta pela deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP). Hoje, a carga horária estabelecida pelo artigo 7º da Constituição Federal assegura ao trabalhador um expediente de até oito horas diárias e 44 horas semanais. O texto inicial da PEC sugere que o limite caia para 36 horas semanais, sem alteração na carga máxima diária de oito horas e sem redução salarial. Isso permitiria que o país adotasse o modelo de quatro dias de trabalho.